Escândalo na realeza. Caitlin Crews

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Escândalo na realeza - Caitlin Crews


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Saberás que o enterro do nosso pai é dentro de uns minutos?

      Pia decidiu que não era uma pergunta real e esperou com as mãos cruzadas à frente dela, como se pudesse ficar assim todo o dia. Olhou para trás do irmão para observar as colinas verdes de Yorkshire por baixo do céu plúmbeo. Matteo observou-a com uns olhos cinzentos e mais escuros do que esse céu.

      – Pareces grávida, Pia – continuou Matteo, como se ela não se tivesse apercebido.

      – Estou.

      – Haverá imprensa e fotógrafos por todos os lados. Não conseguimos evitá-los há seis semanas e, hoje, será ainda pior. Consegues imaginar o choque que uma gravidez evidente causará.

      Tinha de reconhecer, em sua honra, que estava a tentar falar sem cerrar muito os dentes.

      – O que propões que faça?

      Pia perguntou-o sem se alterar, como se não estivesse acordada desde a noite em que o pai morrera. Seria pior se não fosse ao enterro?

      – Pode saber-se como aconteceu? – resmungou Matteo.

      Pia sempre se considerara unida ao irmão. Ao fim e ao cabo, tinham estado os dois sozinhos, com uma diferença de dez anos, no meio da história de amor tempestuosa e exagerada dos pais.

      Eddie Combe fora famoso por ser implacável com os seus adversários e pela sua própria empresa, a Indústrias Combe, que era o fruto desses Combe aguerridos que tinham saído das fábricas têxteis.

      Alexandrina San Giacomo, pelo contrário, fora a mulher mais bonita do mundo. Fora o que tinham dito dela desde que fizera dezoito anos. Estrelas da pop tinham cantado louvores no seu enterro e todos tinham visto a transmissão na televisão. Era raro haver um dia em que Pia não encontrasse alguma biografia onde lhe chamavam «a bela» ou «o anjo do nosso tempo» e isso quando eram moderados.

      A história de amor dos pais fascinara uma geração e ela também se vira transportada, sobretudo, quando o que conhecera do seu amor fora os gritos, a louça partida, esses… barulhos atrás das portas fechadas à chave e a fixação absoluta um com outro, independentemente de quem estivesse no quarto.

      Matteo, com uma beleza sombria e intensa, dedicava-se ao seu papel como herdeiro dos San Giacomo e como sucessor da empresa familiar do pai e era o tipo de filho que podia esperar-se de uma união assim.

      Pia, pelo contrário, fora protegida durante quase toda a sua vida e atribuíra-o sempre às suas bochechas. Tinham-na mandado para um convento e para uma escola para refinar as meninas e toda a família chegara a limites inconcebíveis para que não fosse vista em público.

      Todos diziam que era para a proteger e para o seu próprio bem, mas ela sabia que era porque era pouco elegante e gordinha. A mulher mais bonita do mundo não podia ter uma filha assim, pois não?

      Alexandrina fora um verdadeiro cisne e ela, em comparação, continuava a ser o patinho feio e já se resignara… ou tentara com todas as suas forças.

      – Perguntaste-me como aconteceu?

      Olhou fixamente para Matteo e teve vontade de se rir, mas conteve-se devido à mais do que provável reação do irmão.

      – Não quero dizer que o grites aos quatro ventos, mas tinha quase a certeza de que já… sabias como.

      – Obrigado por brincares com o assunto, Pia – replicou Matteo, num tom cortante. – Alegro-me por tudo isto ser uma piada para ti. O enterro do nosso pai começa dentro de uma hora. Não achas que podias ter-me avisado – o irmão olhou para ela de cima a baixo e ela sentiu que as faces coravam –, disto?

      – Pareceu-me que tinha de o fazer cara a cara e estiveste em Londres desde… – Não queria falar da morte da mãe. – Sabia que virias ao enterro e pensei que podia esperar até te ver.

      Já tinha quase vinte e três anos e, efetivamente, tinham-na protegido desmesuradamente durante toda a vida, mas era uma mulher adulta e não entendia porque se sentia como uma criança quando o seu irmão mais velho a observava com o sobrolho franzido.

      – Isto é um desastre – resmungou Matteo, como se ela não soubesse. – Não é uma brincadeira.

      – Matteo, não és tu que não podes usar quase nada do que tens no armário – replicou Pia, com desenvoltura, porque não podia fazer outra coisa. – Acho que não é preciso dizeres como tudo isto é real.

      Olhou fixamente para ela e abanou a cabeça. Ela tentou fazer boa cara, mas estava envergonhada e sentia que lhe ardiam as faces, como o resto do corpo. Doía-lhe que Matteo olhasse para ela como se estivesse dececionado e receava continuar envergonhada para o resto da sua vida.

      – Lamento muito…

      – Quem é o pai?

      Isso fez com que se sentisse ainda mais envergonhada e com que quase sentisse náuseas.

      – O pai perguntou-me o mesmo – disse ela, em vez de responder à pergunta.

      A resposta era… sórdida e humilhante. Embora lhe tivesse parecido maravilhoso antes. Finalmente, tinha um segredo! Finalmente, era uma mulher moderna como todas as que conhecia! Entrara no seu próprio futuro, deixara de se preservar como uma donzela virgem numa montra só porque, por algum motivo, a família escandalosa se unira e quisera que não cometesse os mesmos erros que eles tinham cometido. Verificara como era divertido até chegarem as náuseas de manhã.

      Matteo franziu mais o sobrolho, algo que parecia impossível.

      – O pai sabia?

      – A mãe e o pai sabiam – corrigiu, num tom fraco.

      Na verdade, a vida que estava a gerar-se dentro dela era o que lhe parecia menos incrível. Não entendia como o mundo poderia girar sem os pais nele. A mãe fora como o céu infinito e propenso a tempestades repentinas, mesmo que fosse na quietude da sua sala. O pai fora como um vulcão. Enorme, imponente e sempre à beira da erupção.

      Como era possível que ambos tivessem desaparecido? Como podia viver com a certeza de que fora ela que os matara de uma forma ou de outra?

      Levou uma mão à barriga e começou a acariciá-la, mas ficou imóvel quando viu que o olhar sombrio de Matteo seguia esse movimento. Outra onda de vergonha apoderou-se dela.

      – O que…? – Matteo abanou a cabeça como se não conseguisse assimilar a informação. – O que disseram?

      – Mais ou menos, o que podia esperar-se. A mãe quis certificar-se de que sabia que era melhor ter um filho, porque as filhas acabavam por nos roubar a beleza.

      Pia preferiu não lhe contar o momento de tensão que tinham vivido quando a mãe e ela se tinham entreolhado e nenhuma das duas comentara o evidente, que ela não fizera algo parecido. Matteo pestanejou e ela continuou.

      – O pai disse e cito textualmente: «Devia ter sabido que acabarias por te tornar uma ordinária.»

      Matteo e ela entreolharam-se por um instante.

      Pia sentiu um nó no estômago e não por causa das náuseas daquela manhã, mas por deslealdade. Os pais sempre tinham sido atrozes. Os arrebatamentos de fúria eram uma das suas formas de se comunicar mais habituais. Sempre tinham sido capazes de dizer coisas terríveis e costumavam dizê-las e, depois, fazer alguma coisa para as compensar. Normalmente, não diziam nada diretamente, mas levavam-na de viagem a sítios remotos ou tinham ataques repentinos de carinho e doçura.

      Sabia que os dececionara, mas se estivessem vivos, a fúria teria dado lugar a algo mais delicado, independentemente do que pudessem ter-lhe dito no ardor das suas reações. Ela também devia tê-lo dito, devia ter deixado claro que sabia que ambos se teriam suavizado.

      Mas já era tarde. Para eles, certamente… e para ela, a filha que sempre os dececionara. Conseguia ouvir movimentos na casa, fora da biblioteca. Os empregados estavam a preparar a receção que haveria depois do enterro e do velório, quando os colaboradores e colegas


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