Para além da verdade. Robyn Donald

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Para além da verdade - Robyn Donald


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Tu irias para a rua nu, se te deixassem – riu-se Rowan. – E se vestisse um sutiã?

      – Ridículo. Parecerias uma sopeira.

      – Pois assim vestida não vou.

      Lamentando-se, Bobo tirou uma camisola de seda preta do guarda-roupa.

      – Os sacrifícos que tenho de fazer… Veste isto por baixo.

      – O que é?

      – Uma camisola, parva. Assim não se verá nada.

      – Não te mereço – sorriu Rowan, vestindo a camisola. Depois voltou a olhar-se ao espelho. – Ah, agora sim.

      – É verdade, não me mereces. Mas ficarás linda assim que deixares de te lamuriar.

      – Não me estou a lamuriar.

      – Claro que estás! O teu pai devia ser uma pessoa maravilhosa, mas educou-te como uma freira. Era demasiado conservador… não te aborreças, mas tenho de te dizer isto. Tens um aspecto tão sexy, tão perverso… e mais pareces o capuchinho vermelho.

      – O capuchinho vermelho?

      – Sim, isso mesmo. E como vais reconhecer o lobo se não espevitares? – suspirou Bobo, abraçando-a.

      – Como? – questionou-se Rowan.

      Tony tinha sido o único homem da sua vida e depois, traumatizada pelo caos que aquela relação tinha gerado, decidiu concentrar-se no seu trabalho, para o qual canalizava toda a sua energia criadora.

      – Esta noite não és Rowan Corbett, artista eremita. És Rowan, uma mulher misteriosa e sofisticada cujos trabalhos dentro de pouco tempo serão comprados a peso de ouro… e eu levarei dez por cento! Por isso vamos, temos muito para vender!

      Meia hora mais tarde, com uma taça de champanhe na mão, Rowan olhava à sua volta procurando ver todos os convidados em roupa interior.

      Mas não a ajudou nada. Continuava assustada. Não deveria ter deixado que Bobo a convencesse. Todas aquelas pessoas vestidas com roupa desenhada por estilistas da moda, tão sofisticadas, tão risonhas… punham-na nervosa.

      Quando olhou para a taça de champanhe vazia, apercebeu-se de que tinha bebido mais que o suficiente para se poder comportar como deveria. Além disso, tinha vinte e sete anos e deveria ter uma atitude de mulher adulta. E, se não sabia fazê-lo, já estava na hora de aprender.

      – Querida, quero apresentar-te a alguém – ouviu a voz de Bobo atrás dela.

      Pelo tom, percebeu que esse «alguém» deveria ser um comprador e voltou-se com um sorriso nos lábios.

      – Sim…

      – Rowan, apresento-te Wolfe Talamantes.

      Como se estivesse suspenso por qualquer coisa, Rowan deparou-se com um homem altissímo… perigoso. Era muito bonito, com feições de pirata, mas o seu potente magnetismo vinha de dentro, não era causado por uma herança genética fortuita.

      O pânico aumentou então, mas sorriu nervosamente ao recordar a sua conversa com Bobo. Wolfe. Lobo em inglês… sem o «e», obviamente.

      Ele franziu o rosto ao vê-la sorrir. Tinha o nariz em forma de linha recta… ou devia tê-lo tido antes de lho partirem. Mas em vez de o desfear, aquilo tornavo-o mais atractivo.

      – Sim, eu sei. É um nome raro.

      Tinha uma voz rouca, muito masculinizada. Uma voz que a fazia sentir um calafrio. À partida, era a voz do lobo.

      – Não, não, desculpe. É que tenho um cão que se chama Lobo.

      – Um caniche?

      – Não, um pastor-alemão.

      – Rowan, o senhor Talamantes está interessado no número quarenta e sete. O jarrão verde.

      – Ah, fico muito contente.

      – Tem muito talento, Rowan – disse ele, apertando-lhe a mão.

      Era absurdo, mas tinha a sensação de que estava a fazer amor… contra a sua vontade, forçada por um desejo maior que a formidável vontade do homem.

      – Obrigada – murmurou, engolindo a saliva.

      Aquele homem tinha um enigma masculino, uma força que a envolvia como se quisesse engoli-la. A arrogância, o tamanho, a força dos seus músculos, faziam-na sentir receio e curiosidade ao mesmo tempo.

      – Desculpem-me! Tenho de ir falar com outra pessoa – disse Bobo, retirando-se.

      Wolfe sorriu.

      – Incomoda-a que fiquemos sós, Rowan?

      Os seus olhos eram verde-esmeralda, com reflexos dourados, como pepitas de ouro a brilhar dentro de um rio. E ao olhá-los, o instinto avisou-a de que deveria fugir porque aquele Wolfe Talamantes tinha o poder de pôr o mundo de pernas para o ar.

      – Claro que não – murmurou, afastando o olhar. – Gosta, então, do número quarenta e sete? – perguntou, tentando desesperadamente parecer uma artista sofisticada a vender o seu produto. – De facto, é uma peça interessante.

      Não pôde dizer mais nada sobre a peça ainda que tivesse dado a vida por ela. Excepto talvez que era da mesma cor que os seus olhos.

      – Uma peça lindíssima – respondeu ele, olhando para os seus lábios.

      O coração de Rowan deu uma volta. Era tão subtil como um martelo, mas o facto de ser tão directo despertou uma resposta imediata em todas as células do seu corpo.

      «Magia negra», pensou, procurando o número quarenta e sete. Tinha bom gosto, era uma das melhores peças.

      – Gostei muito de fazer aquele jarrão – disse, sentindo mais uma vez um nó na garganta.

      – Onde aprendeu a trabalhar com a cerâmica?

      – No Japão.

      – No Japão?

      Ela encolheu os ombros, mas satisfez a curiosidade dele.

      – O artista que mais admiro no mundo vive numa aldeiazinha próximo de Nara, por isso fui aprender com ele.

      Sentia-se como se estivesse debaixo de um potente foco de luz. Pesavam-lhe as pernas e tinha a pele tão sensível que a seda da camisola quase a queimava.

      – Foi assim, tão simples?

      – Bem, não foi simples… No princípio, ele recusou-se a receber-me. Era natural. É um dos ídolos do Japão enquanto eu era uma estranha sem credenciais, uma mulher ocidental de vinte anos.

      – Como o convenceu a dar-lhe aulas? – perguntou Wolfe.

      A frieza do seu tom de voz transmitiu-lhe um calafrio de apreensão pela espinha acima.

      – Acampei na frente da sua casa e, por fim, aceitou ver alguns dos meus trabalhos. Mas achou-os horrorosos, e estive um mês a fazer peças até que me aceitasse como aluna.

      – Reconheceu a sua persistência. E reconheceu o seu talento, de contrário não a teria deixado acampar em frente da sua casa.

      – Era um homem exigente – ela sorriu. – E exigia absoluta obediência.

      – E isso pareceu-lhe difícil?

      O tom rouco da voz dele fê-la estremecer. Só podia compará-lo ao prazer que sentia quando trabalhava com a argila.

      – Muito.

      – Mas conseguiu domar o seu espírito independente.

      – Ou conseguia ou vinha-me embora. Ensinou-me como lhe tinham ensinado a ele. No dia em que me recusei a fazer o que ele queria, disse-me que tinha chegado a hora de me vir embora. Despedimo-nos muito formalmente, mas escrevi-lhe todas as semanas até à sua morte.

      – Quantos anos esteve com ele?


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