O outro lado do amor. Catherine Spencer

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O outro lado do amor - Catherine Spencer


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      – Não faças mais perguntas sobre mim. Perguntei-te sobre a minha mãe. Sei que os meus pais tiveram um acidente de carro numa passagem de nível, que o meu pai morreu e que a minha mãe ficou mal. O que quero saber é sobre a gravidade das suas lesões e se irá recuperar.

      Viu um brilho nos olhos de Dan. Como de decepção.

      – Mudaste muito, Molly. Não és a rapariga que eu conhecia.

      – É o que pretendo!

      – Perdeste a tua doçura.

      – E perdi as minhas ilusões juvenis, doutor. Se tu continuasses fiel às tuas, não sei se hoje serias o médico da minha mãe. Isso faz-me pensar em outra coisa. Por que é que o teu pai não está aqui? Ele é que era o nosso médico.

      – Reformou-se o ano passado. Se queres uma segunda opinião, ele não ta dará. Posso dar-te o número de telefone de um colega, mas, se quiseres um especialista, terás de ir buscá-lo fora de Harmony Cove. Aliás, já consultei o cirurgião-ortopedista da região; ele está de acordo com a minha modesta opinião.

      – Talvez peça uma segunda opinião, sim – disse ao golpear nervosamente o chão. – Entretanto, gostaria que respondesses à pergunta que te fiz. Como é que está a minha mãe? E não me escondas nada. Se achas que não vai recuperar ou se vai ficar inválida para o resto da vida, diz-me.

      – Como toma há muito tempo esteróides para a asma, tem uma forte osteoporose. Isso, aliado à sua idade, a uma dieta pobre e a uma falta geral de cuidados sanitários. Se abraçares essa mulher com força podes partir-lhe as costelas. No acidente, partiu a anca. Colocaram-lhe uns parafusos. É possível que volte a andar, mas, certamente, apenas com o auxílio de um andarilho. Poderíamos melhorar a qualidade dos seus ossos, mas apenas se tomar a medicação. O problema é que se esquece de tomá-los, está deprimida. Parece que não quer ficar boa. Atrevo-me a dizer que quer morrer. Estou a ser suficientemente claro?

      Suficientemente? Aquelas informações deixaram Molly como um pudim Flan. Sentiu um doloroso nó na garganta.

      – Bastante – disse ao abrir a porta. – Obrigada por teres vindo.

      Dan parou.

      – Não tenhas tanta pressa para perder-me de vista. Não me vou embora enquanto não tiver a certeza de que percebeste as limitações da tua mãe. E de como deves tratá-la.

      – A assistente social que entrou em contacto comigo, a teu pedido, explicou-me tudo. E quanto aos cuidados, não preciso que me ensines a mudar os lençóis ou a pôr uma cunha.

      – Não creio que estejas preparada. Há anos que não vês a tua mãe, ela mudou. Prefiro ficar a dar-te apoio moral.

      – Não. Prefiro não ter-te por perto a todo o instante. Se não há uma medicação ou tratamento específico…

      – Mas há – interrompeu Dan. – Vem cá uma enfermeira, duas vezes ao dia, para tratar da tua mãe.

      – Bem. Então, se tiver mais dúvidas, falarei contigo… ou com outro médico… talvez ainda esta semana.

      – Sempre que necessitares, irei esclarecer-te no que puder e virei cá vê-la. A não ser que a tua mãe decida mudar de médico. Chama-me sempre que precisares. Amanhã, se precisares de mim, estarei disponível ao meio-dia. Não estou no consultório do meu pai, mas sim na clínica Eastside, na rua Waverle. Cadie Boudelet, a vizinha, tratará de Hilda na tua ausência.

      – O que é que te faz pensar que Cadie Boudelet estará disposta a ficar com a minha mãe? Nunca se deram muito bem.

      – É ela quem tem tratado da tua mãe desde o acidente. Tem vivido praticamente com ela, desde que teve alta do hospital.

      – Está mais ocupada, assim não tem tempo para meter-se na vida dos outros.

      – Bem, alguém teria de desempenhar o papel de bom samaritano e… como não estavas…

      Molly fechou os olhos para não ver a censura que havia nos de Dan. Quando os voltou a abrir, o homem caminhava pela rua, de costas para ela, com o cabelo preto coberto de flocos de neve. Sem se voltar, entrou no carro e afastou-se.

      Molly observou os pescadores de lagosta a repararem as redes. Só faltavam três meses para a chegada da Primavera, a neve desapareceria e os turistas chegariam. No entanto, o cinzento era agora a cor predominante. Molly odiava todos e cada recanto daquele povoado. Tudo a fazia recordar de como eram os seus habitantes, de visão estreita e tacanhos.

      Fechou a porta e voltou-se para Ariel, que saía da cozinha.

      – Não é preciso irmos às compras, mamã. O frigorífico está cheio.

      – Sim, mas o que está lá dentro pode ter meses, é preciso ver isso.

      – Não, eu verifiquei o prazo de validade dos alimentos. Por exemplo, o leite e os ovos são frescos.

      Se Ariel o diz, então é porque é verdade. Apesar de ter apenas dez anos, contara apenas com a sua mãe e, por isso, tinha sido obrigada a crescer. A sua filha consolou-a nos momentos menos bons, que tinham sido muitos no início.

      – És uma grande miúda! – disse. – Que faria eu sem ti?

      Fazia muitas vezes aquela pergunta, mas naquele dia tomara um novo e sombrio significado. O que faria se Dan descobrisse a verdade e ficasse com Ariel?

      Afastou aquele horrível pensamento da sua cabeça.

      – Vamos subir. Vamos cumprimentar a tua avó. Conhecer-te irá alegrá-la.

      Molly olhou para as escadas, estreitas e escuras, que a faziam recordar a sua minúscula habitação. Quando era mais nova que a filha, aquela casa parecia cheia de ameaças, de monstros que podiam aparecer em qualquer lugar, para castigá-la por ter cometido pecados que nunca chegou a compreender.

      Pela primeira vez estava a vê-la como era na realidade: uma casa fechada, severa e silenciosa, como o homem que a governara com mão de ferro.

      A porta do quarto de seus pais estava entreaberta. Molly empurrou-a e olhou para as recordações. Imediatamente, outras lembranças assaltaram-na. O mesmo tapete no chão, as mesmas cortinas nas janelas e o mesmo crucifixo sobre a cama.

      Quando tinha pesadelos, o pai nunca permitira que se deitasse na cama com eles. Nem sequer na típica manhã de domingo. Nunca lhe contara uma história. Das suas memórias de criança, aquela casa era tão severa como uma prisão. Ao vê-la com olhos de adulta a opinião mantinha-se.

      – Cadie, és tu? – perguntou a mulher.

      Surpreendida por aquela voz tão débil, Molly aproximou-se e constatou que Dan não tinha exagerado. Hilda Paget nunca fora uma mulher grande, mas as feridas, a doença e as dificuldades tinham transformando-a numa sombra daquilo que fora.

      – Não, mãe, sou eu – disse com um enorme sentimento de culpa.

      – Molly? – questionou a mulher. Ao tentar levantar-se gemeu de dor. – Filha, não devias ter vindo. As pessoas vão começar a falar de novo.

      Molly sentia um nó de dor. Deu-lhe um beijo na face.

      – Elas que falem. Vim cuidar de ti e isso é que importa.

      – Mas já tratam de mim. Vem cá uma enfermeira duas vezes ao dia e a Cadie, a vizinha, vem de manhã e à noite e faz as compras para casa. Alice Livingston traz-me sopa à tarde… – apesar dos protestos, tinha segurando-lhe na mão de uma forma que parecia que jamais a voltaria a soltá-la. – Como é que tiveste conhecimento do meu estado de saúde? Quem é que te contou?

      – O teu novo médico falou com uma assistente social do hospital que entrou em contacto comigo. Por que é que não me chamaste? Achas que não iria importar-me? Achas que iria voltar-te as costas?

      – Porque sei o quanto odeias este lugar e o muito que iria custar-te regressar.

      –


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