A Lista Dos Perfis Psicológicos. Juan Moisés De La Serna

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A Lista Dos Perfis Psicológicos - Juan Moisés De La Serna


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única tarefa seria passear pelos campos da propriedade para me certificar de que estava tudo em ordem. Uma vida privilegiada destinada a uns quantos, filhos de berço de ouro, que eternizam nos seus descendentes uma casta real.”

      Estava concentrado nos meus pensamentos quando o telefone tocou:

      ― Doutor, já não há mais pacientes por hoje, os outros dois que faltam cancelaram durante a tarde por diversas razões ― disse a voz da secretária do outro lado do auricular.

      ― Marcou-lhes consulta para outro dia? ― Perguntei surpreendido.

      ― Sim, poderá recebê-los na próxima semana, como é habitual.

      ― Perfeito, então se quiser, terminamos por hoje, continuamos amanhã. Muito obrigada.

      ― Com certeza! Então, até amanhã.

      Desliguei, ainda surpreso com aquela casualidade, que me deixava a meio da tarde sem clientes para atender. Era normal que ao longo da semana tivesse um ou dois cancelamentos, quase sempre por motivos pessoais ou devido a algum imprevisto, mas não dois de seguida.

      Peguei no jornal e abrindo-o com alguma ansiedade, procurei por alguma informação relevante por entre aquele emaranhado de notícias, umas mais chamativas do que as outras.

      ― Não pode ser, ninguém deixa uma consulta para ir ao balé… muito menos por isto, uma estreia de cinema a meio da semana também não é caso para tanto… Ah, muito bem! Agora compreendo, o final da Liga Juvenil. Provavelmente têm algum filho na equipa local ou então são grandes fãs deste tipo de desporto.

      Apesar de não compartilhar daquele passatempo que, em alguns casos, chegava ao fanatismo, concordava que houvesse uma atividade em que as pessoas se pudessem libertar das suas inibições e que se identificassem com um grupo a que normalmente não pertencessem, longe das suas casas ou dos seus trabalhos.

      Era reconfortante ver como as pessoas se reuniam nos cafés a acompanhar as vitórias das suas equipas e a sofrer por cada passe mal feito ou por cada remate não realizado; e igualmente, explodir de emoção quando o ponta de lança roubava a bola, avançava por entre os seus adversários e conseguia finalmente marcar golo.

      Mas se isso era saudável e até purificador, libertando assim emoções primárias, o que mais me chamava à atenção era o efeito que aquilo provocava nas pessoas quando jogava a equipa nacional; aquilo era uma repulsa de sentimento nacionalista, de fraternidade sobre as diferenças, de unidade perante as adversidades.

      Algo que pude comprovar e que me surpreendeu quando viajei para o estrangeiro, foi quando me vi diante de pessoas que não conhecia de lado nenhum e que me trataram como um irmão quando havia um jogo em que jogava a equipa nacional, independentemente do país onde me encontrasse.

      Uma explosão de alegria e emoção que parecia ter levado os meus dois pacientes desta tarde a trocar as suas consultas pelos seus passatempos.

      Naquele momento, pude ouvir a porta da entrada fechar-se. A minha secretária tinha saído de forma tão sorrateira, quanto ela era. Nunca queria interromper-me, pois por vezes ficava a rever casos, tirando anotações nos relatórios dos pacientes que acabava de atender, ou a consultar algum desses livros de psiquiatria volumosos que se acumulavam nas estantes da biblioteca.

      ― O saber não ocupa espaço! ― Dizia-lhe eu, quando ela me recriminava por não fazer um intervalo de descanso entre um paciente e o outro. Penso que, por isso, já não se preocupava em avisar-me que iria sair, mesmo que fosse só para ir buscar um café da máquina à receção.

      Olhei pela janela que dava para um parque mais próximo e reparei que tinha começado a chuviscar. Eram cinco horas da tarde, mas o sol, parecia apressado hoje, pois quase que já não se o via na rua, por entre aquelas nuvens negras que se tinham apoderado daquele céu limpo com que amanheceu.

      “Vou esperar que clareie um pouco e então depois saio”, disse para mim mesmo enquanto regressava à minha poltrona. Pus-me a observar ao meu redor, por entre aquelas quatro paredes, onde tinha passado uma boa parte da minha juventude, tentando ajudar as pessoas a melhorar as suas vidas, naquilo que elas se permitiam a si mesmas fazer.

      Era reconfortante ver como algumas delas com tão pouca ajuda conseguiam avançar e superar aqueles pequenos momentos difíceis da vida que nos atrasam no nosso desenvolvimento; e, por outro lado… havia outras que por muitas sessões que tivessem eram incapazes de se dar conta da sua situação e do quão prejudicial isso era para elas próprias e para as suas relações com os outros.

      “Ah! Se as paredes falassem!”, pensei para mim. Fechei o relatório do paciente que tinha acabado de atender, após fazer algumas anotações sobre o seu progresso e levantei-me para o guardar no ficheiro que tinha separado para todos os clientes que estava a atender de momento, deixando as gavetas de baixo para os que já tinham superado ou abandonado a terapia.

      Estava à procura do lugar onde colocar a pasta do paciente com base no seu apelido quando a campainha tocou.

      “Que estranho! ― Disse para mim mesmo. ― A minha secretária tem a chave. Talvez seja um dos dois pacientes que cancelaram. Às tantas, o jogo foi cancelado devido à chuva e vem recuperar a hora da consulta”, pensei enquanto saía da sala, e atravessando a receção, aproximei-me da porta.

      Abrindo-a apressadamente, vi que do outro lado da porta encontrava-se uma senhora de idade, um pouco desleixada, que começava a escorrer água sobre o tapete da entrada.

      ― Pode entrar, minha senhora ― eu disse com suavidade enquanto lhe cedia passagem e afastava-me da frente da porta.

      ― Obrigado meu jovem, e desculpe por vir assim toda molhada.

      ― Não se preocupe, ninguém fazia ideia de que o tempo iria mudar assim tão depressa ― comentei, justificando o facto de não estar a usar guarda-chuva, uma vez que a única coisa que usava para se proteger, era um simples lenço na cabeça.

      ― Onde é que posso deixar isto? ― Perguntou, enquanto retirava o lenço, em gesto de o querer escorrer.

      ― Por aqui tem uma pequena casa de banho onde pode escorrê-lo, se é isso que quer ― disse-lhe enquanto a indicava e fechava a porta atrás de si.

      ― Obrigado, peço desculpa pelo incómodo.

      ― Não há problema.

      A senhora entrou na casa de banho e ali escorreu, sobre o lavatório, uma boa parte da água que tinha conseguido bloquear com o lenço, evitando assim ficar toda ensopada.

      ― E o casaco? ― Perguntou ao sair da casa de banho.

      ― Eu coloco-o no cabideiro ― Respondi, enquanto o recolhia.

      ― É muito amável. ― Insistiu. ― Já agora, sabe se o doutor pode-me atender hoje? ― Perguntou com uma voz suave.

      ― Claro que sim, sou eu o doutor. ― Respondi com um leve sorriso.

      ― Ah! Mas você ainda é tão jovem, até parece que foi ontem que saiu da universidade ― comentou contrariada.

      ― É que me conservo muito bem, sabe como é, um pouco de exercício diário e uma boa alimentação.

      ― Ah! Então vai ter que me dar a receita, pois a mim os anos não me têm tratado tão bem ― protestou enquanto colocava a mão sob o ombro, creio que seria por se recordar de alguma fratura que tivesse tido ou algo assim. ― Bem, onde é que podemos conversar? ― A senhora perguntou com voz impaciente.

      ― Pode ser no meu escritório. ― Indiquei, surpreendido por aquela pergunta.

      ― Prefiro ali. ― Disse, apontando para o sofá da sala de espera.

      ― Pois então se prefere aí…

      ― Sim, obrigado. ― Ela disse, dirigindo-se para a poltrona.

      Segui-a e sentei-me na cadeira da secretária, que coloquei de lado para poder ficar de frente para ela.

      ―


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