Uma bala com o meu nome. Susana Rodríguez Lezaun
Читать онлайн книгу.uma noite realmente fantástica, prazenteira e gratificante, surpreendente em tantos aspetos que seria impossível enumerá-los todos. Desfrutei do meu corpo e do sexo como nunca e acho que participei ativamente para que ele também alcançasse cotas altas de prazer.
Cansada e feliz, aninhei-me junto do seu corpo quente e adormeci.
O sol acordou-nos várias horas depois. Doía-me a cabeça, tinha a boca pastosa e as pernas pesavam uma tonelada. Ao meu lado, Noah continuava a dormir profundamente. Afastei-me dele com cuidado, procurei o meu robe e dirigi-me para a casa de banho.
Olhar-me ao espelho foi como receber uma bofetada na cara. É claro, tinha-me deitado sem me desmaquilhar e a maquilhagem que, com tanto cuidado, apliquei na tarde anterior espalhara-se ao redor dos olhos, dando-me o mesmo aspeto do que um panda espetral. Estava pálida, suja e despenteada.
Tranquei a porta, livrei-me do robe e entrei no duche, onde esfreguei cada centímetro de pele para eliminar os restos de suor alcoólico. Saí do duche limpa, mas o meu aspeto não melhorara demasiado. Tinha um jovem imponente na cama que estava prestes a descobrir a velha com quem fora para a cama. Apostava que não demoraria mais de dez minutos a ir-se embora.
Sequei o cabelo e deixei-o solto. Depois, apliquei uma camada generosa de creme hidratante por baixo dos meus olhos e distribui uma dose discreta, mas reparadora, de maquilhagem pela minha cara. Um pouco de rímel e um bocadinho de blush completaram o trabalho de restauração. Não estava perfeita, mas, pelo menos, estava apresentável para passar pela despedida sem me envergonhar demasiado.
No quarto, Noah continuava a dormir. Olhei para ele por um instante. Estava a ver o homem mais atraente que alguma vez conhecera. Estive tentada a voltar a deitar-me ao seu lado, mas, em vez disso, decidi ir à cozinha e fazer o pequeno-almoço. Não era que tivesse fome, mas precisava de me ocupar com alguma coisa.
Fiz café, torrei pão, fritei alguns ovos e pus fruta num prato. Tirei manteiga, leite e doce do frigorífico e pus tudo na mesa da cozinha. Estava prestes a servir-me de uma chávena de café quando Noah apareceu na soleira da porta. Vestira os bóxeres. E mais nada. Fiquei com falta de ar e, quando esboçou um sorriso, acho que me ferveu o sangue nas veias. Dirigiu-se para mim e beijou-me no cabelo com delicadeza.
— Cheiras muito bem — murmurou. — Eu, pelo contrário, cheiro mal. Lamento muito.
Acariciei-lhe a mão que depositara no meu ombro.
— Não cheiras mal — garanti, porque era verdade. — Toma o pequeno-almoço e, depois, poderás tomar banho antes de…
Deixei a frase a meio. Não quis dizer antes de se ir embora, se bem que fosse o que pensava. O meu coração e o meu cérebro debatiam-se numa luta interna feroz. Por um lado, entendia que isto era uma aventura e que, como tal, o melhor era acabá-la quando ainda perdurava o bom ambiente. Mas, por outro lado, fora tão curta que não me importaria de a prolongar um pouco mais. Só um pouco mais.
Testemunha muda do meu debate interior, Noah sentou-se em silêncio na cadeira mais próxima da minha e serviu café nas duas chávenas. Deu-me uma e bebeu da dele. A intensidade do seu olhar começava a incomodar-me.
— Vou-me embora assim que mo pedires — declarou.
Abanei a cabeça e insultei-me mentalmente.
— Não me interpretes mal — repliquei. — Não é que queira que te vás embora ou que fiques. Quero que faças o que queres. Não és obrigado a ficar para me fazer sentir bem. Já estou bem. De facto, melhor do que estive em muitos anos. Mas entenderei que queiras ir-te embora o quanto antes. A luz do sol revela as verdades que a noite esconde.
— A única verdade aqui — interrompeu —, é que gosto muito de ti. Ontem, deslumbraste-me. Hoje, estás a fascinar-me.
Levantei-me e criei um pouco de distância entre os dois. Tremiam-me as mãos e achava que, se ficasse ali sentada, o tamborilar do meu coração também seria evidente para ele.
— Quantos anos tens? — perguntei, sem rodeios.
— Vinte e seis.
— Eu tenho quarenta.
— E isso é importante por algum motivo?
Noah bebia devagar da sua chávena de café, sem parar de olhar para mim. Respirei fundo e decidi dizer o que me consumia há um bom bocado.
— Podemos divertir-nos, mas não vamos mais além. As nossas vidas são diferentes, certamente, tal como os nossos interesses e as nossas aspirações na vida. Gosto muito de ti — reconheci, com um suspiro —, mas…
— Achas que sou um preguiçoso? Um ignorante que ganha uns trocos a trabalhar como empregado de mesa e arredonda a tarefa a seduzir senhoras ricas? Estás muito enganada. Não quero nada teu. Nada material, pelo menos.
Pousou a chávena na mesa e levantou-se. Eu não sabia o que dizer. Interpretara mal as minhas palavras, não era isso que queria dizer.
— Não me entendeste — balbuciei. — Por favor, senta-te e vamos falar. Não podes ir assim.
Noah olhou para mim por uns segundos e, finalmente, acedeu. Voltou a sentar-se e fixou os seus olhos azuis em mim.
— Bom — comecei a dizer —, sinto consciência de quem sou. De facto, sinto-me consciente do que gostaria. E não me refiro ao meu cargo no museu ou ao facto de ter uma vida mais ou menos desafogada. Refiro-me a mim. Tenho quarenta anos, estou sozinha por decisão própria e não entendo os motivos que um homem como tu pode ter para querer estar comigo. E não falo do teu trabalho, do teu dinheiro ou da tua formação. De facto, não sei nada sobre ti. Falo da tua idade e da minha, do meu aspeto e do teu. Quero divertir-me. Há tantos espaços em branco na minha vida que, às vezes, eu própria me assusto. Sou uma pessoa solitária que fala com as plantas dos vasos, que murmura para as pinturas com que trabalha e a quem nunca aconteceu algo extraordinário. Tu és extraordinário e é por isso que estou à defesa, porque me preparo para quando desapareceres. O que aconteceu ontem foi fantástico. Viverei com essa lembrança durante muito tempo. Mas não tem sentido fingir que pode repetir-se, não achas? Sê sincero também.
— Sabes? Acho que não pode haver nada pior do que perceber, no teu leito de morte, todas as coisas que não fizeste e que a tua vida foi uma merda. Devia haver um inferno para essas pessoas, que passariam a eternidade a lamentar as oportunidades perdidas. Eu não quero ser uma delas. Não tenciono deixar o meu rasto na história, prefiro que a vida me marque. Por isso, quando alguma coisa me chama a atenção, quando descubro alguma coisa que acho que pode enriquecer a minha vida, vou atrás dela. Ontem, vi-te. Vi uma mulher muito atraente, com muita classe, que estava sozinha e aborrecida e quis conhecê-la. Gostei do que descobri e ponto final. E aqui estou, a deixar que a oportunidade me leve para onde quiser. Tenho vinte e seis anos. Tu, quarenta. Não vejo onde está o problema. Mas se preferires que me vá embora, só tens de mo dizer.
Observei-o atentamente.
— Acaba o pequeno-almoço e toma um duche — consegui dizer. — Na verdade, cheiras realmente mal.
Noah foi-se embora três horas mais tarde, depois de mais sexo, um almoço esplêndido e o compromisso da minha parte de que jantaria com ele. Não voltámos a separar-nos até à tarde de domingo.
As semanas seguintes decorreram numa nuvem plácida. Trabalhava com um sorriso nos lábios e precipitava-me pela escada assim que o meu dia de trabalho acabava para ir ter com Noah, que me esperava no estacionamento do museu junto da sua mota. Passeámos pela praia, comemos, bebemos e fizemos amor como se aqueles fossem os nossos últimos dias na Terra. Eu continuava a ter as minhas dúvidas sobre a conveniência dessa relação, mas era mais fácil deixar-me levar pela maré de sensações prazenteiras. A outra opção era regressar à solidão, ao silêncio e ao ostracismo. Queria viver. Por uma vez, queria desfrutar daquilo que os outros pareciam ter por direito próprio e que me tinham negado desde que conseguia recordar. Ou que eu própria negara, não sei.
Comprei roupa, estreei sapatos de salto e maquilhava-me