Obras Completas de Luis de Camões, Tomo III. Luis de Camoes

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Obras Completas de Luis de Camões, Tomo III - Luis de Camoes


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esquecerião,

      Postoque mal me tratárão;

      Annos não me lembrarião,

      Que como est'outros passarão,

      Tempos tristes passarião.

      Se fosse galardoado

      Este trabalho tão duro,

      Não vivêra magoado.

      Mas não o foi o passado,

      Como o será o futuro?

      De cansar não cansaria,

      Se quizereis, que cansasse;

      Cavar, morrer, fa-lo-hia;

      Tudo, emfim, esqueceria,

      Se algum'hora vos lembrasse.

– oOo —MOTE ALHEIO

      Triste vida se me ordena,

      Pois quer vossa condição

      Que os males, que dais por pena,

      Me fiquem por galardão.

Glosa

      Despois de sempre soffrer,

      Senhora, vossas cruezas,

      A pezar de meu querer,

      Me quereis satisfazer

      Meus serviços com tristezas.

      Mas, pois em balde resiste

      Quem vossa vista condena,

      Prestes estou para a pena;

      Que de galardão tão triste

      Triste vida se me ordena.

      De contente do mal meu

      A tão grande extremo vim,

      Que consinto em minha fim:

      Assi que vós e mais eu,

      Ambos somos contra mim.

      Mas que soffra meu tormento,

      Sem querer mais galardão,

      Não he fóra de razão

      Que queira meu soffrimento,

      Pois quer vossa condição.

      O mal, que vós dais por bem,

      Esse, Senhora, he mortal;

      Que o mal, que dais como mal,

      Em muito menos se tem,

      Por costume natural.

      Mas porém nesta victoria,

      Que comigo he bem pequena,

      A maior dor me condena

      A pena, que dais por gloria,

      Que os males, que dais por pena.

      Que mor bem me possa vir,

      Que servir-vos, não o sei.

      Pois que mais quero eu pedir,

      Se quanto mais vos servir,

      Tanto mais vos deverei?

      Se vossos merecimentos

      De tão alta estima são,

      Assaz de favor me dão

      Em querer que meus tormentos

      Me fiquem por galardão.

– oOo —MOTE ALHEIO

      Ja não posso ser contente,

      Tenho a esperança perdida;

      Ando perdido entre a gente,

      Nem morro, nem tenho vida.

Glosa

      Despois que meu cruel Fado

      Destruio huma esperança,

      Em que me vi levantado,

      No mal fiquei sem mudança,

      E do bem desesperado.

      O coração, que isto sente,

      Á sua dor não resiste,

      Porque vê mui claramente

      Que pois nasci para triste,

      Ja não posso ser contente.

      Por isso, contentamentos,

      Fugi de quem vos despreza:

      Ja fiz outros fundamentos,

      Ja fiz senhora a tristeza

      De todos meus pensamentos.

      O menos que lh'entreguei,

      Foi esta cansada vida:

      Cuido que nisto acertei,

      Porque de quanto esperei

      Tenho a esperança perdida.

      Acabar de me perder

      Fôra ja muito melhor;

      Tivera fim esta dor,

      Que não podendo mor ser,

      Cada vez a sinto mor.

      De vós desejo esconder-me,

      E de mi principalmente,

      Onde ninguem possa ver-me;

      Que pois me ganho em perder-me,

      Ando perdido entre a gente.

      Gostos de mudanças cheios,

      Não me busqueis, não vos quero:

      Tenho-vos por tão alheios,

      Que do bem que não espero,

      Inda me ficão receios.

      Em pena tão sem medida,

      Em tormento tão esquivo

      Que morra, ninguem duvída;

      Mas eu se morro, ou se vivo,

      Nem morro, nem tenho vida.

– oOo —A HUMA DAMA, QUE SE CHAMAVA ANNAMote

      A morte, pois que sou vosso,

      Não a quero; mas se vem,

      Ha de ser todo meu bem.

Glosa

      Amor, qu'em meu pensamento

      Com tanta fé se fundou,

      Me tẽe dado hum regimento,

      Que quando vir meu tormento

      Me salve com cujo sou.

      E com esta defensão,

      Com que tudo vencer posso,

      Diz a causa ao coração:

      Não tẽe em mi jurdição

      A morte, pois que sou vosso.

      Por exprimentar hum dia

      Amor se me achava forte

      Nesta fé, como dizia,

      Me convidou com a morte,

      Só por ver se a temeria.

      E como ella seja a cousa

      Onde está todo meu bem,

      Respondi-lhe, como quem

      Quer dizer mais, e não ousa:

      Não a quero, mas se vem…

      Não disse mais, porque então

      Entendeo quanto me toca;

      E se tinha dito o não,

      Muitas vezes diz a boca,

      O que nega o coração.

      Toda a cousa defendida

      Em mais estima se tem:

      Por isso he cousa sabida,

      Que


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